O filme A MISSÃO, dirigido pelo cineasta Rolland Joffè, mostra um jesuíta espanhol que vai para a América do Sul para formar uma missão e com isso pregar o cristianismo junto aos índios. Com estes componentes, o compositor Ennio Morricone concebeu uma trilha sonora que é considerada uma autêntica opera contemporânea. A fusão perfeita da música associada à dramaticidade produzida pelas cenas permitiu que a trilha sonora do filme se transformasse em mais uma realização grandiosa do compositor Ennio Morricone.
Na obra do compositor, vamos encontrar exemplos fantásticos, em que Arias permitem a vazão de estados emocionais, como ocorreu nas trilhas para O GREGO (1968) e ainda GIORDANO BRUNO (1973). Essas duas trilhas possuem uma linguagem musical que expressa os abismos de uma alma. Poderíamos dizer que ambos os trabalhos apenas esboçaram o que viria a transformar-se em algo majestoso, em que a alma romântica de Morricone inspira-se para a música “O oboé de Gabriel”, ao mesmo tempo em que o talento melódico e a capacidade de oferecer uma pintura sonora na música batizada de “On Earth As It Is In Heaven”. Na trilha, o coro oferece grandes perspectivas como observador, consciência e espelho de reflexão, como ficam evidenciados em “Te Deum Guarani”. Uma obra talentosa com peso nacionalista com base na situação latina do continente e a expressão de excitação e compaixão, sentimentos que são captados melodicamente pela capacidade extraordinária de um compositor de rara sensibilidade como Morricone. Não por acaso, em seus concertos, temos sempre dois momentos em que essa trilha é apresentada.
Desde 2001, quando passou a dedicar-se a sua atividade concertista, Ennio Morricone tem regido diferentes orquestras e coros, de diferentes localidades, saindo da Itália e circulando por países como Espanha, Inglaterra, Hungria, Checoslováquia, Portugal, Rússia, Estados Unidos, México, Chile, Brasil, Japão, Coréia, China e tantas outras localidades que admiram e respeitam o seu talento e apreciam sobremaneira a sua música.
Ennio Morricone mais uma vez foi indicado pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, mas não ganhou o Óscar pela música de A MISSÃO, mas, em compensação, outros prêmios foram conferidos como o Globo de Ouro e o Bafta da Inglaterra.
A repercussão do trabalho de Ennio Morricone, para a trilha sonora de A MISSAO, foi tão extraordinária que recebeu várias homenagens. Em 1989, Morricone foi homenageado pela Universidade de Sapienza, uma conceituada instituição universitária de Roma, celebre pelos concertos que promove através de uma aula magna que foi dedicada a Ennio Morricone e transmitida ao vivo pela RAI. Neste mesmo ano, Ennio Morricone recebeu outra homenagem, desta vez do Conservatório de Liege, na França, que dedica ao maestro um concerto que é regido por ele, num evento memorável.
Em 2008, por ocasião de uma entrevista que fiz com Morricone, quando de sua passagem por São Paulo, tive a felicidade de ver respondida uma pergunta que foi formulada várias vezes e que nunca se havia obtido a informação. Trata-se da pergunta sobre qual seria a trilha sonora preferida de Morricone, cujas respostas ao longo do tempo variaram entre “todas” ou então “a última”. Bem, me senti profundamente realizado por dois aspectos: primeiro por ter sido o primeiro jornalista a lembrar do trabalho para AD OGNI COSTO, o qual deu a chance para Morricone compor um samba. A outra foi justamente de saber qual a trilha que Morricone tem mais apreço, descobrindo então tratar-se de um trabalho pouco conhecido e valorizado, para o filme UN UOMO A META, de 1965, dirigido por Vittorio Sisti. Trata-se de um drama que deu ao ator Jacque Perrin o Prêmio Volp do Festival de Veneza.
Quanto à trilha sonora de A MISSÃO, se ela não é a mais bela produzida por Ennio Morricone, pelo menos é aquela que conseguiu se despreender mais rapidamente do filme e ter vida própria, longe das imagens.