MORRE MORRICONE, MAS SUA MÚSICA É IMORTAL!

Enviado por admin em qui, 07/09/2020 - 12:11
Marcio Alvarenga com Maestro Ennio Morricone nas dependências do Teatro Alfa de São Paulo em 2008 logo após a realização da entrevista.

Em julho de 1741 o mundo da música erudita perdia um grande expoente, o italiano Antonio Vivaldi. No dia 06 de julho de 2020, o mundo que ecoou-lhe a fama e sua música  conquistando uma juventude entusiástica, perdia Ennio Morricone. Agora, ao lado de outros astros no firmamento como Verdi, Rossini, Vivaldi, Rota, brilha a estrela representando Ennio Morricone. No dia 24 de março de 2008 tive a oportunidade de estar diante de Ennio Morricone, por ocasião da sua segunda passagem pelo Brasil. Dois meses antes da sua apresentação, fiz contato com sua assessoria de imprensa, quando então fiquei sabendo que ele não daria entrevista. Sua assessoria, num gesto de reconhecimento do meu esforço, ofereceu a oportunidade para que eu pudesse assistir ao ensaio de Morricone com a Sinfonietta Orchestra de Roma, que o acompanhou na apresentação. Cheguei faltando vinte minutos para o início do ensaio, previsto para as 15 horas. O taxi que me levou acabou errando e parando nos fundos do Teatro Alfa, mas mesmo assim desci ali mesmo e vi um portão aberto. Ao entrar fui logo interpelado por um segurança que me perguntou:

- Você é membro do Coro?

Sem pestajenar, respondi afirmativamente, quando então ele me apontou o caminho que me conduziria ao palco do teatro. Do palco pude acompanhar todo o ensaio e ainda fazer amizade, com o Mário, assistente da orquestra italiana. Ao final do ensaio pedi ao Mario, se poderia bater um papo com Morricone, o que o italiano chama de “quatro chiacchiere”. Quando menos esperava, eis que Il Maestro Morricone estava na minha frente, disposto a conceder uma entrevista. Quando você é tomado por uma grande emoção, isso acaba tolhendo o seu próprio raciocínio, bem por isso, nem sabia o que perguntar para início de conversa. Quando perguntei como ele costumava compor, obtive uma resposta curta e grossa, “me sento e escrevo”! Pegou mal para o repórter, tinha que me redimir dessa, engatei então a segunda pergunta quando então procurei saber como foi a primeira experiência da sua carreira em compor um samba, por ocasião do filme A Qualquer Custo de 1967, que tem algumas cenas rodadas no Brasil. Morricone então se surpreendeu com a pergunta, já que nunca ninguém tinha demonstrado esse tipo de curiosidade. Percebi então que havia conquistado a sua confiança, pois sua resposta foi longa e detalhada. Na época, ele ficou conhecendo um grupo musical de brasileiros e coincidentemente Morricone estava gravando a trilha sonora do filme A Qualquer Custo. Il Maestro acabou então  convidando o grupo  para gravar quatro musicas brasileiras e que integram essa trilha sonora. Morricone complementou ainda dizendo que essa experiência foi muito importante, já que dois anos depois em 1969, ele seria convidado por Chico Buarque, exilado na Itália, para fazer os arranjos e regência de um disco que o brasileiro gravou na Itália. Então, Chico para homenagear Morricone colocou o título no seu LP de “Per Um Pugno Di Samba”, numa analogia ao primeiro filme da trilogia de Sergio Leone, o filme Por Um Punhado de Dólares, que acabou sendo a primeira trilha de sucesso de Morricone no gênero spaghetti-western. Um outro momento histórico da entrevista ocorreu quando perguntei a respeito da sua obra da chamada “musica assoluta” as composições eruditas, indagando a Morricone qual foi o momento em que el,a foi refletida na sua obra para o cinema. Para minha surpresa, contrariando outras entrevistas em que perguntaram a Morricone sobre qual era sua trilha favorita, sendo que ele até então jamais tinha feito qualquer menção a uma trilha específica. Pela natureza da pergunta feita, ao fazer referência ao seu campo erudito, ele me surpreendeu ao afirmar que a trilha sonora do filme UM HOMEM PELA METADE de 1966, era sua trilha preferida. Foi a mais importante entrevista que realizei na minha carreira profissional, pois além de estar diante de uma verdadeira lenda da música no cinema, estava perante aquele que foi por todo esse tempo o meu grande ídolo. Para quem não aprecia muito a música, ela pode representar apenas um fenômeno acústico. Os teóricos da música poderiam entende-la como um problema de melodia, harmonia e ritmo. Mas para quem soube apreciar as composições de Ennio Morricone, elas podem representar  desde um desdobrar das asas da alma até mesmo a realização de todos os sonhos e anseios de quem ama. A música de Morricone é imortal!